Dívida Pública atingiu R$ 7,3 trilhões, em 2024 A dívida

Dívida Pública atingiu R$ 7,3 trilhões, em 2024
A dívida do setor público consolidado registrou alta de um ponto percentual em julho, atingindo 77,6% do PIB — o equivalente a R$ 9,6 trilhões, segundo dados do Banco Central.
➡️ Entretanto no padrão do Fundo Monetário Internacional (FMI), utilizado para comparação internacional — que inclui esses títulos que estão na carteira do BC no endividamento brasileiro —, a dívida do país é muito maior: 90% do PIB (patamar de julho).
🔎 A dívida do setor público consolidado é um conceito fiscal que representa o montante total das obrigações financeiras assumidas por um ente da Federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), apurado sem duplicidade, e que deve ser amortizado em prazo superior a 12 meses.
A metodologia utilizada no cálculo do indicador, entretanto, não observa as normas internacionais. Em nota, o Banco Central informou que seu método, utilizado desde 2008, “reflete as características institucionais brasileiras”.
👉🏽 A explicação é que o BC não contabiliza, na dívida pública, os títulos do Tesouro Nacional que estão em sua carteira. Esses papeis são utilizados para regular a liquidez no mercado e o custo dos juros (taxa Selic) no curto prazo, que está atualmente em 15% ao ano.
Por que isso é importante?
💵 A relação entre dívida e PIB é um indicador relevante para o mercado financeiro, interpretado como um sinal da capacidade do país de honrar seus compromissos financeiros de curto, médio e longo prazo. Quanto maior o indicador, maior o risco de um calote em momentos de crise.
➡️ Além disso, com uma dívida mais alta, impulsionada pelos gastos públicos nos últimos anos, há uma pressão maior sobre a taxa de juros brasileira. Isso se reflete nos juros cobrados pelo mercado financeiro do setor produtivo da economia, restringindo o crescimento do país.
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Recomendação do FMI
Segundo o BC, em agosto do ano passado, o FMI avaliou a adequação das estatísticas fiscais do Brasil às regras internacionais, a pedido do Tesouro Nacional brasileiro.
Na ocasião, o BC informou que o FMI reafirmou sua metodologia e recomendou que o Brasil passe a adotar seu formato de cálculo, incluindo na dívida todos os títulos emitidos pelo Tesouro Nacional na carteira do BC.
“A adoção dessa e das demais recomendações ainda depende da análise dos compiladores nacionais, entre outros, referente à sua adequação ao arcabouço institucional do país”, acrescentou o Banco Central.
Comparação internacional
Quando utilizado o critério internacional de comparação, calculado pelo FMI, a dívida brasileira, que terminou 2024 em 87,3% do PIB, ficou:
longe de economias emergentes, cujo patamar somou 69,5% do PIB no fim do ano passado, e também de países da América Latina (70% do PIB);
acima da média de nações do Oriente Médio e Ásia Central, assim como de países da África Subsaariana;
muito próximo do padrão de países da Zona do Euro;
abaixo de economias avançadas e de países do G7 (sete maiores economias do mundo).
Relatório do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) recomendou em 2023 que os países da América Latina e Caribe reduzam sua dívida pública para um patamar entre 46% a 55% do PIB. O objetivo seria aumentar a confiança dos investidores e possibilitar a redução da taxa de juros, com efeitos positivos sobre o nível de atividade e sobre o emprego.
Essa é a mesma posição externada em 2023 pelo ex-presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, indicado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL). Para ele, a comparação apropriada para o nível da dívida pública brasileira deve ser feita com os demais países emergentes.
“Não adianta querer se comparar com os Estados Unidos”, acrescentou, na ocasião.
Também no ano retrasado, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, avaliou que dívida brasileira não precisa estar no mesmo patamar dos emergentes porque há “diferenciais importantes” na economia brasileira, como praticamente ausência de dívida em dólar e mercado financeiro doméstico desenvolvido, entre outros.
“É difícil falar sobre isso, é uma mega discussão. A Índia tem divida maior do que a nossa, é um país também em desenvolvimento. Cresce bastante, tem uma trajetória estável de dívida, e segue o jogo. Comparar o Brasil com a América Latina? O Brasil é mais comparável com a Índia ou com o Peru?”, questionou o secretário do Tesouro, Rogério Ceron, em 2023.
Evolução no tempo
A série histórica da dívida brasileira, pelo padrão do Fundo Monetário Internacional (FMI), começou a ser calculada pelo Banco Central no fim de 2001. Naquele momento, somava cerca de 67% do PIB.
Os números do BC mostram que o endividamento permaneceu relativamente estável até 2014, o último ano do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff (PT).
No primeiro ano do segundo mandato de Dilma, em 2015, a dívida deu um salto de 10 pontos percentuais. Em 2016, subiu outros seis pontos percentuais. Dilma sofreu “impeachment” em agosto daquele ano.
Os dados do BC mostram que a dívida continuou crescendo na gestão Temer, e atingiu seu ápice em 2020, sob Jair Bolsonaro, por conta de gastos extraordinários relacionados com a Covid-19.
Apesar de mais de R$ 660 bilhões em despesas extraordinárias com a pandemia, a dívida caiu quando se considera toda gestão Bolsonaro, pois estava em 87,1% do PIB em 2019 (início do mandato), terminando 2022 (último ano do governo) em 83,9% do PIB.
No terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o endividamento subiu seis pontos percentuais em cerca de dois anos e meio por conta do aumento de despesas públicas, algo que tem pressionado a taxa de juros, tais como:
PEC da transição: governo aprovou, ainda em 2022, a chamada PEC da transição, por meio da qual ampliou o limite para gastos públicos, permanentemente, em cerca de R$ 170 bilhões por ano.
Reajuste real do salário mínimo: governo Lula retomou a política de reajustes reais do salário mínimo, ou seja, aumentos acima da inflação (limitada a 2,5%). Esse foi um dos principais fatores a elevar as despesas, visto que os benefícios previdenciários não podem ser menores que o salário mínimo.
Pisos saúde e educação: governo retomou a política de que os gastos mínimos em saúde e educação são atrelados à receita, e não mais à inflação do ano anterior (essas rubricas estavam dentro do teto de gastos, do presidente Temer, até então).
Pagamento de precatórios atrasados: o que injetou R$ 92,3 bilhões na economia no fim de 2023, início de 2024. A Fazenda admite que isso influenciou a aceleração no ritmo de crescimento do setor de serviços.
Reajustes a servidores públicos: governo retomou política de reajustes a servidores públicos, que estava represada no governo Jair Bolsonaro, com base na inflação. Houve ampla mesa de negociação com cerca de 100 categorias contempladas.
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Arcabouço fiscal
Para tentar conter o crescimento da dívida, em 2023 o governo aprovou o chamado “arcabouço fiscal”, ou seja, novas regras para as contas públicas em substituição ao teto de gastos. Por estas regras:
a despesa não pode registrar crescimento maior do que 70% do aumento da arrecadação;
a alta de gastos fica limitada, em termos reais, a 2,5% por ano;
o arcabouço busca conter o crescimento da dívida pública no futuro.
➡️Sem um corte robusto de despesas, necessário para manter de pé o arcabouço fiscal, especialistas em contas públicas estimam que a regra terá de ser abandonada nos próximos anos. Eles argumentam que, no atual formato, as regras ficarão insustentáveis.
Projeções para a dívida no futuro
Relatório do Tesouro Nacional divulgado em julho deste ano projeta que a dívida pública vai continuar subindo nos próximos anos, atingindo 84,3% do PIB em 2028, recuando um pouco, para 83,5% do PIB em 2033. A metodologia utilizada nas estimativas, porém, é do governo brasileiro.
➡️Se for utilizado o método do Fundo Monetário Internacional (FMI), pelo qual, segundo o BC, a dívida brasileira tem ficado, em média, 12 pontos percentuais mais alta, as projeções do Tesouro Nacional ficariam muito maiores: entre 95% e 96% do PIB até 2033.
➡️Sem confiança no arcabouço fiscal, analistas do mercado financeiro estimaram, na semana passada, que a dívida pública brasileira deve atingir 93,7% do PIB em 2034 (pelo conceito brasileiro). Pelo conceito adotado pelo FMI, a dívida brasileira superaria 100% do PIB em 2035.
Grau de investimento mais longe
▶️Por conta da alta no endividamento e das dúvidas sobre a credibilidade da política do governo para as contas públicas, a chefe de ratings soberanos da Fitch Ratings para Américas e Ásia, Shelly Shetty, informou nesta semana que a agência não vê, no curto prazo, o retorno do Brasil ao chamado grau de investimento.
▶️Enquanto o governo foca em novos aumentos de impostos para tentar elevar a arrecadação equilibrar as contas públicas, economistas apontam que o controle de gastos seria importante para conter a inflação, proporcionando redução da taxa de juros no futuro e, consequentemente, uma trajetória mais benigna para o endividamento brasileiro.
▶️Em maio, a agência de classificação de risco Moody’s já havia do a revisão da perspectiva da nota de crédito do Brasil, que passou de “positiva” para “estável”, indicando que o Brasil não vai obter o grau de investimento no curto prazo. A Moody’s também citou a piora na perspectiva está relacionada às contas públicas.
▶️O anúncio das agências de rating é um banho de água fria na equipe econômica, que vem buscando a retomada da classificação desde o início do terceiro mandato do presidente Lula. Isso foi defendido pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), em 2023, e também pelo secretário do Tesouro, Rogério Ceron, no ano passado.
O que dizem analistas
🔎O grau de investimento, obtido pelo Brasil entre 2008 e 2015, é um selo de qualidade que assegura aos investidores um menor risco de calotes. A partir da nota de crédito que determinado país recebeu, os investidores podem avaliar se a possibilidade de ganhos (por exemplo, com juros) compensa o risco de perder o capital investido com a instabilidade econômica local.
Entre as iniciativas que poderiam ser propostas pelo governo para frear o ritmo de crescimento dos gastos obrigatórios, estão:
Contenção de gastos com servidores, por meio de uma reforma administrativa;
Mudanças nas regras de gastos previdenciários, por meio de uma nova reforma da Previdência ou de medidas que alterem despesas previdenciárias;
Reforma de gastos sociais para fundir as políticas existentes e evitar sobreposição;
Mudanças nas regras do abono salarial e do seguro-desemprego.
Outros, como o consultor de Orçamento da Câmara dos Deputados, Paulo Bijos, ex-secretário de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento, pedem as chamadas “desvinculações”. Como, por exemplo:
Desindexação de benefícios do RGPS e do BPC do salário mínimo: os benefícios previdenciários deixariam de ter aumento acima da inflação, e passariam a ser corrigidos somente pela variação dos preços do ano anterior, ou por até 0,6% ao ano. A economia potencial projetada para a medida em 10 anos (2025-2034) é de R$ 1,1 trilhão sem ganho acima da inflação, ou de R$ 890 bilhões com alta real (acima da inflação) de 0,6% ao ano. Pela regra atual, o salário mínimo, e os benefícios previdenciários, podem crescer até 2,5% ao ano acima da inflação.
Revisão dos pisos da saúde, da educação e do Fundeb: os gastos com saúde e educação deixariam de ser atrelados à receita, formato atual, e passariam a ser corrigidos pela inflação, ou por 0,6% ao ano acima da inflação. O cálculo indica o “ganho” de R$ 97 bilhões a R$ 77,5 bilhões entre 2026 e 2028 – um montante de recursos que a saúde e a educação deixariam de receber neste período.
Fonte: g1.globo.com
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Fonte: g1.globo.com