O Ministério Público Federal (MPF) intimou a Caixa

O Ministério Público Federal (MPF) intimou a Caixa Econômica Federal a explicar o destino das poupanças abertas por pessoas escravizadas no século XIX, com prazo até 15 de setembro de 2025 para apresentar respostas. A medida, inédita para uma instituição bancária brasileira, foi motivada por uma representação do movimento Quilombo Raça e Classe.
Na reunião realizada em 15 de agosto, participaram representantes da Caixa, do movimento social e a historiadora Keila Grinberg, da UNIRIO e Universidade de Pittsburgh. O encontro discutiu a retenção dos valores após a Abolição da Escravatura e a responsabilidade do Estado e das instituições financeiras no contexto histórico.
As poupanças foram abertas a partir de 1871, com a Lei do Ventre Livre e o regulamento de 1872, permitindo que pessoas escravizadas depositassem dinheiro para financiar a compra da própria liberdade ou de familiares. Esse registro é um marco na história econômica e social do país, revelando mecanismos de resistência durante o período escravista.
O procurador da República Julio José Araújo Junior, responsável pelo inquérito, ressaltou que a investigação busca esclarecer o paradeiro dessas poupanças e a responsabilidade pela retenção dos recursos. Além disso, busca garantir o acesso à informação a descendentes dos escravizados e ao público em geral, preservando a memória histórica.
Segundo Keila Grinberg, algumas pessoas escravizadas ou seus descendentes conseguiram sacar as poupanças até a Abolição, em 1888, mas muitas não tiveram acesso aos valores. As contas rendiam cerca de 6% a cada seis meses, o que levanta questionamentos sobre o destino e a gestão desses recursos após o fim da escravidão.
Durante a audiência pública, a Caixa reconheceu possuir um acervo histórico extenso, com cerca de 15 quilômetros lineares em documentos. Contudo, afirmou que a catalogação completa poderia levar mais de 20 anos. O MPF, por sua vez, estipulou um prazo de 30 dias para que o banco informe as providências tomadas para organizar, catalogar e digitalizar o material.
O procurador destacou ainda o aspecto reparatório da investigação, que visa corrigir omissões históricas e garantir melhores condições para os descendentes das pessoas escravizadas. Ele afirmou que, apesar do tempo transcorrido, a apuração é necessária para prevenir violações futuras e promover memória, verdade, responsabilização e reparação.
Em nota, a Caixa afirmou que já permitia a abertura de poupanças para compra da alforria antes da Lei do Ventre Livre. A instituição assegurou que as cadernetas estão preservadas, disponíveis para pesquisa e mantidas por equipes multidisciplinares.
A Caixa também declarou que pesquisas realizadas até o momento não identificaram contas de escravizados que tenham sido sacadas por seus senhores após a Abolição. Por outro lado, há registros de titulares que movimentaram suas contas depois de 1888, como a do escravo Ismael, que retirou valores em 1889.
A intimidação representa um marco no reconhecimento do papel das instituições financeiras no cenário histórico da escravidão no Brasil e na busca por respostas que envolvem direitos e memória social.
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Palavras-chave relacionadas: escravidão, poupança, Caixa Econômica Federal, Ministério Público Federal, Abolição, Lei do Ventre Livre, memória histórica, reparação, Quilombo Raça e Classe, patrimônio documental, Brasil século XIX.
Fonte: g1.globo.com
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Fonte: g1.globo.com